Portfólio

corrosões críticas — subversões do tempo — dioramas

...não há morte, mas transformação contínua, encadeamento de estados e transmutações. Agnaldo Farias

Durante os preparativos da Bienal de 2010, o curador Agnaldo Farias e o artista Rodrigo Bueno, idealizador do ateliê Mata Adentro, se encontraram para entender as coincidências de seus Terreiros, projetos homônimos com muito em comum. Surgiu a partir daí, no mesmo ano, colaborações em mostras intensas como a ‘Ponto de Equilíbrio’ no Instituto Tomie Ohtake, onde Rodrigo criou um espaço de encontro estruturado na transformação de refugos de madeiras e plantas em um ambiente ao mesmo tempo provocador e acolhedor. Em seguida, outras mostras como ‘Matuto ao Cubo’, no Estúdio Buck e ‘Parque das Transgressões’ na Galeria SIM, intensificaram a troca entre artista e curador. Enquanto planejam para o Museu da Casa Brasileira, a coletiva ‘Experimentando Espaços’, Agnaldo e Rodrigo convidam para uma conversa aberta, na individual curada pela mesma dupla, intitulada ‘Vida Nova’, na Galeria Emma Thomas. O tema proposto é o atrito entre Cultura e Natureza. ‘Vida Nova’ traz a tona a coautoria de traças e fungos em imagens icônicas da pintura trazem ao espectador parte da pesquisa do ateliê Mata Adentro, que enfatiza a força da natureza reivindicando seu espaço. Será uma conversa fértil, que conta com a participação de todos os interessados, a fim de ampliar a consciência não só em relação a constante busca do homem através da arte, mas também sobre seus paradoxos materiais e metafísicos. Celebremos o fato de que, afinal, não há morte, mas transformação contínua, encadeamento de estados e transmutações. A individual do artista paulista Rodrigo Bueno, o idealizador do ateliê Mata Adentro, apresenta um novo desdobramento de sua pesquisa sobre o atrito entre Cultura e Natureza, a tensão entre a racionalidade e a irracionalidade, o ataque implacável das plantas, da umidade habitada por fungos, traças e cupins sobre os cadeiras, sofás e os vários objetos com que povoamos as nossas casas com a finalidade de obtermos conforto e aconchego. A vida prossegue, adverte Rodrigo Bueno, e não será a placidez das paredes cuidadosamente pintadas, como as paredes da sala de uma galeria, capaz de impedir esse fluxo. A coautoria de traças e fungos em imagens icônicas da pintura trazem ao espectador parte da pesquisa do ateliê Mata Adentro, que enfatiza a força da natureza reivindicando seu espaço. Rodrigo recolhe objetos ou partes de objetos abandonados em depósitos ou em esquinas à espera dos caminhões de lixo, para despertá-los, devolve-los à vida, fazendo com que neles rebentem plantas, folhagens vivas e reluzentes, até então adormecidas pelos processos industriais. Suas obras celebram o fato de que, afinal, não há morte, mas transformação contínua, encadeamento de estados e transmutações. Agnaldo Farias

Estado Laico

São registros do livro de fotos históricas corroídas acidentalmente por traças e cupins no atelier Mata Adentro durante quase dois anos.

São dípticos – impressões em papel algodão em duplas, imagens corrompidas e justapostas: o final da construção de Brasília e os nativos.

Ícones revisitados que confrontam a decadência do ideal futurista da capital e o deslocamento do legado ancestral, em um esvaziamento da alma indígena. A corrosão natural levanta questões atuais sobre ocupação de território e reveladora ação do tempo. Vemos a capela oficial da presidência da república contradição corrompida de um Estado laico, ao lado, marcas profundas levam à reflexão sobre o ocaso de nossa identidade, onde o nativo se dissolve em meio á destruição da trama original.

Novas  leituras da obra de grandes fotógrafos como Peter Scheier e Harald Schultz presentes no livro “BRAZIL” da editora Colibris. Rio Janeiro, década de 50.

Uroboro é uma instalação parte da mostra coletiva curada por Agnaldo Farias na SIM Galeria em Curitiba de 30 de agosto a 28 de setembro de 2013. Durante a feira ART RIO, Nosco Gallery de Londres mostrou obras da mesma série.

“Na arte a instabilidade é o resultado direto do exercício da transgressão, da vontade consciente de se impor contra as normas, contra o que está estabelecido, da necessidade de prosseguir adiante pela crença que o futuro do ser reside em parte no que já foi conquistado mas, sobretudo, em tudo aquilo que ainda não foi pensado, no que se pode ser encontrado quando se avança por um território escuro, que só pode ser designado através de invenção de novas formas de linguagem ou pela reinvenção das já existentes. Fazer arte significa jogar com ela própria, rever seus próprios pressupostos, o que é o mesmo que indagar, com método e sem subterfúgios: o que é arte? Uma pergunta que traz consigo a lembrança da dificuldade em se pretender fixar um conceito que desde o nascimento do moderno, no século XIX, vem afirmando sua repulsa a classificações. Daí seu gosto pela ironia, pelo modo matreiro de jogar com seus próprios elementos constitutivos, piscando-nos o olho quando faz qualquer afirmação, o que serve para sublinhar sua ambiguidade, os ardis que ela enreda no uso da linguagem da qual se serve e que contribui para construir.

A arte é contemporânea quando impulsionada pelo desejo de transgressão, quando traz consigo, à flor de sua pele, a consciência de sua finitude, uma espécie de vingança através dos tempos e espaços que ela sistematicamente concebe, contra o desejo de estabilidade, quietude, calma e morte.”
Agnaldo Farias

As molduras e as instalações Guiratinga, Araucária e Jacarandá tem colaboração do artista Emiliano Prodócimo.

As traças fizeram uma colaboração inusitada. De hábitos noturnos, os insetos devoraram várias camadas dos livros, trazendo à tona imagens renovadas, plenas de novos significados e associações.
Na Sim Galeria Curitiba

Ebó de gaveta

Ebó é uma conjunção de elementos que evocam a harmonia ou o conflito de energias telúricas. Ao dinamizar forças, tal orquestração reverbera movimento em planos tanto sutis como densos.

Caixas, vitrines e gavetas são como invólucros de memória e reserva de linguagem, de suprimento para um futuro próximo, fragmentos de um passado associando-se ao presente, testando novos sentidos.

Gavetas recuperadas das ruas encapsulam um tempo suspenso, como um arquivo de um museu de história natural, um pequeno ambiente oculto, um gabinete de curiosidades onde uma trama de folhas e raízes, madeiras e sementes instigam a uma visão surreal. Entre asas de diversas borboletas e insetos se desdobram criaturas híbridas. Uma visão pós-apocalíptica onde outra ordem se estabelece, como uma dança intimista, ao ritmo de um renascimento que ilustra a vida em constante transformação.

Ficha técnica: Gavetas de madeira recuperada das ruas com impressões em papel de algodão de imagens de um livro de arte comido por traças e cupins. Sobre a impressão foi inserido uma série de fragmentos borboletas, folhas, sementes, galhos, raízes entre outros objetos. A caixa é coberta por uma chapa de acrílico pintada com uma simulação de fungos.